No início da madrugada do dia 02/12/2024, uma intensa linha de instabilidade atuou no Litoral Sul de SC, formada por células de tempestade aproximadamente contínuas e dispostas de forma alinhada, com nuvens de intenso desenvolvimento vertical e temperaturas negativas entre – 60 a -70°C, conforme imagem de satélite (Figura 1). Essas nuvens de tempestade provocaram ventos fortes e queda brusca da pressão atmosférica (Figura 2). Essa condição atmosférica gerou ondas anômalas no oceano, surpreendendo os moradores de Jaguaruna, no Litoral Sul de SC, com o fenômeno natural e raro chamado Tsunami Meteorológico (Figura 3).
O que é um Tsunami Meteorológico?
Uma onda que invade a praia, arrastando o que está próximo, como barcos de pesca ancorados e carros estacionados, e inundando casas e restaurantes. A onda apresenta características similares às de um tsunami “tradicional” (i.e. de origem sísmica), mas é originada a partir de forçantes meteorológicas. Em inglês é chamada de “meteotsunami”. Ao contrário das ondas normais no mar, que possuem período, o tempo entre a passagem de duas ondas consecutivas, entre 4 e 20 segundos, os Tsunamis Meteorológicos possuem períodos variando entre poucos minutos até algumas horas. Essa característica faz o meteotsunami parecer mais com uma grande inundação costeira do que com uma onda normal.
Para se formar o tsunami meteorológico depende da combinação de alguns fatores: a velocidade de deslocamento da linha de instabilidade atmosférica precisa coincidir com a velocidade de deslocamento das ondas no mar geradas por esse sistema, de forma a criar um mecanismo de ressonância que amplifica o meteotsunami; a direção de deslocamento da linha de instabilidade precisa estar alinhada com a plataforma continental e linha de costa, de forma que a batimetria local possa atuar como uma pista para a propagação e intensificação da onda.
Embora o fenômeno seja raro, há registro de outras ocorrências em Santa Catarina, a maioria em outubro e novembro, devido a primavera ter alta incidência de tempestades.
19/11/2009, Pântano do Sul, Florianópolis (rajada recorde de 103 km/h em Criciúma)
16/10/2016, Balneário Rincão e Araranguá
29/10/2019, Balneário Rincão e Imbituba
11/11/2023, Praia do Cardoso, Laguna
25/05/2024, verificado nos dados da estação do Porto de Imbituba
Os dados de nível do mar coletados pela rede de marégrafos da EPAGRI/Ciram permitem identificar e mensurar a ocorrência desses fenômenos em alguns pontos do litoral de Santa Catarina. Essa rede é composta por 5 estações maregráficas que monitoram as condições de mar aberto e mais 3 no interior da baía da Babitonga. As informações do nível do mar estão disponíveis e de forma gratuita na plataforma web litoral online da EPAGRI/Ciram https://ciram.epagri.sc.gov.br/litoral-online/.
O tsunami meteorológico da madrugada do dia 02/12/2024 foi registrado pela estação maregráfica situada na plataforma de pesca em Balneário Rincão. A Figura 4 mostra que o evento teve seu início às 00h33min e foi composto por quatro ondas menores, de período em torno de 8 a 9 minutos que se empilharam para formar uma grande onda com pico (crista superior) sendo registrado às 1h02min. Nos 9 minutos seguintes ao pico o mar retrocedeu ao seu ponto mais baixo, encerrando o registro do evento às 01h11min. A Figura 4 mostra ainda que a altura da onda total na subida do mar foi de 1,88 metros e na descida do mar de 2,04 metros.
Carlos Eduardo Salles de Araújo – Oceanógrafo
Gilsânia Cruz e Laura Rodrigues – Meteorologistas
Figura 1 – Imagem do satélite GOES-16, do dia 02/12/2024, à 01h00min. Horário local.Fonte: CPTEC/INPE.
Figura 2 – Variação brusca da pressão atmosférica em Jaguaruna entre a noite do dia 01 e madrugada do dia 02/12/2024.
Figura 3 – foto divulgação/SDC.
Figura 4 – Registro de variação do mar no marégrafo de Balneário Rincão entre a noite do dia 01 e madrugada do dia 02/12/2024.